quinta-feira, 1 de outubro de 2009

A mãe trabalha, os filhos engordam... ou talvez não...


Um grande estudo britânico sugere que a saúde das crianças cujas mães trabalham poderá estar a ser prejudicada.


No filmeBaby Boom(Quem Chamou a Cegonha), Diane Keaton é uma mulher de negócios que se vê de repente obrigada a criar o bebé de um familiar que morreu. Tudo corre mal no início - no seu trabalho, na sua relação amorosa - porque ninguém, nem sequer ela própria, sabe lidar com a nova situação. Mas como a protagonista é uma força da natureza e isto é só cinema, acaba por encontrar o equilíbrio ao mudar-se para o campo, onde funda uma empresa de alimentos caseiros para bebé. E vive feliz para sempre junto dos seus dois novos amores (a nova filha e o novo namorado), num ambiente idílico e saudável, trabalhando em casa e cuidando da sua família.

A vida real, essa, é muito menos hollywoodesca: uma proporção cada vez maior de mulheres vive nas cidades e não tem outra opção senão trabalhar fora de casa, deixando os seus filhos ao cuidado de terceiros. E, agora, vem um grande estudo dizer-lhes que isso faz mal aos filhos, suscitando comentários de leitoras, nomeadamente nosite da BBC, a dizer, entre outras coisas, que isso as faz sentir ainda mais culpadas por terem de trabalhar em vez de tratar dos filhos.

O estudo, realizado no Reino Unido, afirma que as crianças em idade pré-escolar que não têm a mãe por perto todo o dia comem mais guloseimas, vêem mais televisão, jogam mais computador e mexem-se menos do que aquelas cujas mães ficam em casa.

Catherine Law, do University College de Londres, que com a sua equipa acaba de publicar este trabalho no Journal of Epidemiology and Community Health, não ignora que o tema é muito sensível - e é por isso que afirma, num comunicado, que os resultados "não implicam que as mães não devam trabalhar" e que "são precisas políticas e programas que ajudem as famílias a criar um ambiente saudável para os seus filhos". Mas lá está: o estilo de vida dos filhos ressente-se da falta de disponibilidade da mãe.

Os investigadores fizeram um inquérito junto das mães de 12.576 meninas e meninos de cinco anos de idade, no âmbito de um grande projecto em curso sobre as condições de vida das crianças, o UK Millenium Cohort Study. As mulheres responderam a uma série de perguntas acerca da sua vida profissional, donde se deduz que 60 por cento trabalham em média 21 horas por semana, enquanto 30 por cento deixaram de trabalhar quando o seu filho ou filha nasceu.

As inquiridas forneceram igualmente informações sobre os hábitos alimentares e o nível de actividade ou inactividade física dos seus filhos. Comiam muitas guloseimas e doces? Bebiam muitos refrigerantes açucarados? Que quantidade de fruta e vegetais ingeriam por dia? Participavam em actividades desportivas organizadas? Iam para a escola a pé ou de automóvel?

Tendo eliminado os factores que poderiam confundir os resultados, tais como o nível de instrução da mãe e as circunstâncias socioeconómicas das famílias, os cientistas constataram que as crianças cujas mães trabalhavam a tempo inteiro ou parcial tinham uma maior tendência para beber refrigerantes entre as refeições do que as crianças cuja mãe não trabalhava. Essas mesmas crianças eram também mais susceptíveis de passar pelo menos duas horas por dia à frente da televisão ou do computador e serem levadas à escola de automóvel em vez de irem a pé ou de bicicleta. E as crianças cujas mães trabalhavam a tempo inteiro tinham uma menor tendência para comer frutas ou legumes entre as refeições ou para comer três ou mais peças de fruta por dia.

O panorama parece de facto preocupante, pois indicia, tal como estudos anteriores, que existe uma relação entre o facto de a mãe ter um emprego e o risco de obesidade infantil. "Pouco se sabe sobre os potenciais mecanismos subjacentes a esta relação", dizem os investigadores. Os resultados do actual estudo parecem indicar que uma maior flexibilidade nos horários de trabalho poderá contrariar esta tendência, mas este efeito não ficou confirmado.

Onde está o pai?

A situação profissional dos pais das crianças não foi tida em conta no estudo. Os autores argumentam que isso se deve ao facto de "os padrões de trabalho dos homens terem evoluído relativamente pouco nas últimas décadas", ao passo que os das mulheres mudaram radicalmente. Mas esta poderá ser de facto uma falha do estudo, pois não tem em conta as famílias onde a mãe trabalha e o pai trata dos filhos. "Os autores do estudo não verificaram se os pais estavam ou não presentes em casa", lê-se noGuardian, que publicou um artigo relativamente crítico em relação aos resultados.

"O estudo parece demonstrar que existe uma desvantagem em termos de saúde devido ao facto de mãe trabalhar, mas não mostra que os filhos de mulheres que trabalham são menos saudáveis do que os filhos de mães que não trabalham", contrapõe o mesmo diário britânico, acrescentando que, "de facto, os dados em bruto (...) indicam quase precisamente o contrário da conclusão estatisticamente ajustada".

E especifica que, antes de se ter eliminado os factores socioeconómicos, étnicos, etc., os resultados até pareciam apontar para a situação contrária, com "as crianças cujas mães trabalham a comer mais frequentemente fruta e legumes por dia, participando mais vezes em actividades desportivas". O único sinal contrário era que essas crianças "iam mais facilmente de carro para a escola do que os filhos de mães sem emprego".

"O que estudo mostra", lê-se ainda, "é que se considerarmos duas famílias com rendimentos idênticos, o mesmo número de filhos e etnias semelhantes, então os jovens das famílias onde a mãe não trabalha têm tendência para fazer mais exercício físico, ter uma alimentação mais saudável e ver menos televisão." Resumindo: ainda há muito por esclarecer sobre as reais consequências para a saúde de uma infância passada sem a mãe por perto o dia todo.




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