sexta-feira, 1 de maio de 2009

Maioria das mães escolhe licença de cinco meses...



Miriam Martins, de 35 anos, está grávida de cinco meses e meio e já falou com o companheiro sobre o que acontecerá depois do parto. Ele, um realizador de programas de 45 anos, ficará um mês em casa com a criança; ela, uma desenhadora projectista, terá uma licença de cinco. O casal de Lisboa faz questão de usufruir das novas regras de protecção na parentalidade que entram hoje em vigor. E que abrem a possibilidade de a licença parental inicial poder prolongar-se até aos seis meses, desde que partilhada pelos dois progenitores. Os números mostram que a ideia de que os bebés devem ser acompanhados mais tempo tem cada vez mais adeptos.

Em Janeiro deste ano, mais de metade (52 por cento) das recém-mamãs optaram por uma licença pós-parto de cinco meses - o máximo que a lei previa até agora. É uma inversão do cenário que existia há quatro anos.

Em 2005, por exemplo, cerca de 75 por cento das portuguesas escolhiam uma licença de quatro meses, pagos a 100 por cento. Os dados mensais agora fornecidos pelo Instituto de Segurança Social (ISS) mostram aquilo que pode ser encarado como uma democratização crescente da licença na sua versão mais longa. Em Janeiro de 2007, as mães que optavam por ficar em casa cinco meses, ainda que recebendo apenas o equivalente a 80 por cento da sua remuneração de referência, já representavam quase dois quintos das beneficiárias. Em meados de 2008, já havia quase tantas mulheres com licença de quatro meses como as que aderiam à licença maior e pior remunerada.

"De alguma forma era esperado que isto acabasse por acontecer", diz Karin Wall, investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e autora de vários estudos sobre licenças parentais na Europa.

Ele a mudar fraldas?

"Os estudos mostram que o desejo da maioria dos pais é poder ficar em casa com os filhos até aos seis, nove meses de idade. E, por outro lado, a possibilidade de tirar uma licença maior [que existe desde 2004] foi sendo mais conhecida." Mais: "Mesmo mulheres que terão salários menos altos estão a escolher a licença de cinco meses".

A investigadora admite, contudo, que a licença partilhada de cinco ou seis meses - possibilidade introduzida na lei que hoje entra em vigor - pode precisar de mais tempo para ganhar expressão. Porque implica um maior envolvimento dos homens. "Mas preparou-se o terreno para esta ideia: o pai é um cuidador como a mãe e pode tomar conta do bebé tão bem como ela." Será?

As novas regras têm entre os seus objectivos a maior partilha de responsabilidades entre homens e mulheres. Miriam Martins sorri. Ainda não imagina o companheiro "a mudar fraldas" quando ela voltar ao trabalho e ele ficar em casa sozinho com o bebé Sebastião, um mês inteiro. Mas garante que foi ele próprio que disse que também queria partilhar a licença pós-parto.

"Achamos que vai ser uma boa experiência para ele ficar com o filho. E achamos também que, para a criança, quanto mais tempo ficar em casa, melhor", conta Miriam no mesmo parque perto de casa onde brincava quando era miúda e onde já se imagina a brincar com o primeiro filho.

O PÚBLICO falou com outras futuras mães. Todas ouviram falar da lei nova. Nem todas acham que mais homens vão tirar licenças maiores.

605 partilharam

Ana Sofia Ferreira, de 29 anos, aluna de doutoramento em Química, está grávida há 12 semanas. Da nova lei, elogia sobretudo o facto de fazer aumentar de cinco para dez o número de dias que o pai tem direito a gozar nos primeiros dias de vida da criança. "É importante, porque é um período em que a mulher está muito debilitada."

Quanto ao resto, não há muito a discutir: "Para ele é muito complicado tirar um mês inteiro no trabalho. Tem um cargo de responsabilidade, é chefe de um projecto". Ou seja, a possibilidade de partilharem a licença pós-parto nem se colocou. Ana ficará em casa cinco meses.

"Ainda há resistências a que os homens pais fiquem mais tempo em casa quando nasce um filho, há resistências dos próprios homens e das empresas", diz Carla Lopes, advogada, de 32 anos e com 27 semanas de gravidez.

As "resistências" traduzem-se em dados como estes: há anos que a lei previa que pais e mães pudessem chegar a acordo sobre a partilha dos quatro ou cinco meses de licença de maternidade, sem que isso tivesse reflexos, contudo, num subsídio maior. No ano passado, só 605 homens aderiram. Uma gota no oceano tendo em conta que houve cerca de 75 mil mulheres a receber subsídio de maternidade.

Banheira no escritório

Carla espera pelo nascimento de uma menina que se chamará Beatriz e já deu "uma vista de olhos" na nova lei. Ela e o marido têm falado da possibilidade de optarem pelos seis meses de licença. Mas ele ainda não falou com ninguém na empresa. "É preciso ver bem que transtornos pode isto causar." É que se "para a mulher ficar em casa é visto como uma inevitabilidade" após o parto, para "o homem ainda não".

O que os números não mostram é quantas mulheres, recebendo subsídio de maternidade, continuam, ainda assim, a trabalhar. Margarida (nome fictício), grávida pela segunda vez, é sócia-gerente de uma empresa familiar de metalomecânica. Quando há cinco anos nasceu a primeira filha, levou o parque, a banheira e tudo o que era preciso para transformar o escritório e uma sala ao lado num espaço mais amigável, agarrou na bebé e regressou ao trabalho 15 dias depois do parto.

Só já perto dos três anos - quando a menina começou a "desligar os fios dos computadores" - é que foi para a creche. "Dava-lhe imensa atenção na mesma estando ela comigo no trabalho. E não tenho feitio para ficar quatro meses em casa. Para além de que tenho muitas responsabilidades." Com o bebé que vem a caminho, deverá passar-se algo parecido.

E o pai? Acha que os cuidados com os bebés devem ser prestados sobretudo pela mãe. "É um pouco aquela ideia: 'É um ser tão frágil, é melhor não ser eu a cuidar.' Mas ele ajuda noutras coisas."


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